JUNHO/14
Como publicar um livro?
É a pergunta que persegue muitos aspirantes a
autores, muitos indivíduos que sonham em ter um livro seu publicado numa casa
editorial conhecida. Se pretende publicar um livro pela mera ideia fantástica de ser escritor, então pense duas vezes. O
termo escritor já não se aplica hoje em dia a todas as pessoas que têm livros
publicados.
Mas
se alguém pretende ser levado a sério nesta profissão, a verdade é que é fácil
publicar hoje em dia, se se souber
combinar uma boa dose de inteligência, perspicácia, disciplina e paciência.
Inteligência para conhecer o mercado e saber o que ele deseja num momento
particular, perspicácia para saber quais os jogadores que interessa contatar,
disciplina para escrever uma obra que mereça ser publicada com início, meio e
fim, e paciência (na dose certa) para alcançar o objetivo.
Vamos supor que temos um indivíduo, o Sr. Silva,
que concluiu uma obra que considera ser merecedora da atenção de editores. O
Sr. Silva primeiro tem que ter consciência de que não são as opiniões de amigos
que deverão fazê-lo pensar que é bom. Os amigos de aspirantes a escritores não
devem ser considerados amigos do Sr. Silva; não são exigentes, têm medo de
dizer a verdade para não magoar o amigo por isso preferem deixar o amigo fazer
figuras, muitos deles não compreendem o mundo de edição de livros, mas ainda
assim encorajam o pobre Sr. Silva. Há que recorrer a pessoas/amigos que saibam
do que falam, com experiência de leitura e escrita.
Mas
imaginemos que o Sr. Silva até escreveu um manuscrito catita no qual investiu
muito labor e pesquisa. Atenção que não falo de uma obra que tem potencial
mas que só precisa de uma revisão, leia-se, precisa de ser toda
reescrita. Se o Sr. Silva fosse uma celebridade, bastaria ligar para marcar uma
reunião e provavelmente já teria publicação garantida em certas editoras, mas
sendo um anônimo, como deve ele proceder para alcançar a tão almejada
publicação?
Antes
de mais, qualquer aspirante a escritor que se preze deveria conhecer o mercado
que temos e acompanhar o trabalho que se tem realizado de ano para ano pelos
vários intervenientes no processo. São inúmeras as casas editoriais que existem,
cada uma com a sua área de publicação específica. E atenção que eu não
considero válido o trabalho das vanity presses que publicam à
custa do autor. Já falei desse tipo de serviços antes e por esta altura é claro
que não tenho uma palavra boa a dizer dessas empresas.
Conhecer
o mercado é um aspecto importante. Atrevo-me a dizer tão importante quanto ter
uma bagagem considerável de leituras para poder
ser um melhor escritor.
Graças à Internet e à postura cada vez mais
flexível das editoras, é possível ter um melhor vislumbre do modo de
funcionamento do mundo de edição luso – brasileiro. Há blogs de referência que acompanham
regularmente as novidades editoriais, e também aquilo que se passa no mundo dos
livros. Assim o Sr. Silva fica a conhecer várias coisas que apenas poderão
beneficiá-lo, em particular, quais as editoras que lhe interessam na área que
pretende publicar.
Assim,
se a obra do Sr. Silva foi inspirada por Boris Vian, Mallarmé, Zweig, Malraux
ou Faulkner, não precisa de recorrer a uma editora que publique apenas
literatura romântica. Mas se tiver sido antes inspirada por Tolkien, Gene
Wolfe, Jack Vance, Whittemore, Silverberg, Vandermeer então o Sr. Silva sabe
que não será qualquer editora que publicará seu livro.
Agora
que o Sr. Silva fez um bom trabalho de pesquisa e elaborou uma listinha de
editoras - alvo para a sua obra (se o Sr. Silva tiver 18 anos, aconselha-se a
esperar até aos 25 anos de idade), tem que passar ao próximo passo. O que vou
escrever em baixo não significa que seja a solução tiro e queda para se ser
publicado. Não há fórmulas nem palavras mágicas que permitam abrir as portas da
edição. Mas parece-me que não é um mau conselho para ser partilhado.
Convenhamos, já ninguém envia manuscritos por
correio hoje em dia, a não ser por exigência de regulamentos de prêmios
literários. Mas quando um escritor se dedica a uma candidatura espontânea, tem
que primeiro preparar uma carta (ou e-mail) em que procurará convencer o editor
com uma boa argumentação de que o manuscrito que tem em mão tem potencial de
publicação. A escrita desta carta diz muitas coisas sobre a pessoa que a
escreveu. Diz se a pessoa está desesperada e está praticamente a implorar para
ser publicada, diz se a pessoa sabe escrever ou não, em suma, diz se a pessoa
deve ou não ser levada a sério.
Não
recomendo ao Sr. Silva que exponha a sua vida desde a infância nesta carta. Deve limitar-se a escrever sobre
a obra em si, e só quando for relevante acrescentar fatos de cunho pessoal ou profissional. Não vale a pena puxar
galões, não vale a pena mencionar doenças tenebrosas, não vale a pena dizer que foi rejeitado por 500 editoras antes
de chegar às presentes mãos. A carta é
sobre o livro, mas depois há a sinopse, que vai à parte.
A
sinopse de um livro é sempre algo extremamente complicado de elaborar. O Sr.
Silva não quer deixar de mencionar um ou outro detalhe sumamente interessante e
acaba por escrever um texto longo, enfadonho, desinteressante, que mata o seu
livro em poucos segundos de leitura. Em manuscritos de fantasia isto então
torna-se particularmente grave quando são adicionados nomes inventados em
mundos inventados. Kalkahsh de Tyrin, príncipe do reino das Sete Cidades, é declarado
inimigo mortal do irmão Karaknov e defrontam-se na batalha de Sum Dum nos
campos de Cehcitheh... Zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz....... Fim da
leitura.
A sinopse deve destacar o cenário, o enredo, o
tema, as personagens, mas pouco mais e sempre de forma concisa, tentando
trazendo ao de cima o potencial da obra. Não o prejudica nada se pensar: será
que um leitor tem interesse em ler esta obra até ao fim?
Quando
já tem a carta feita, deve então procurar contatar as editoras da sua listinha
e tentar saber o nome do editor/editores e qual a melhor forma de submeter um
manuscrito à sua apreciação. Como hoje em dia é tudo feito por e-mail, assim
que souber os e-mails do editor ou assistente, envia então a cartinha com a
sinopse mais o manuscrito anexado. O Sr. Silva que peça para acusarem a
recepção da obra e se não acusarem, telefona a chatear. O mínimo que uma
editora deve fazer é acusar a recepção do e-mail.
E
depois vem a espera... A longa e excruciante espera... Não sei qual o tempo em
média que se deve esperar. De qualquer modo, a haver interesse, o Sr. Silva
será contatado. Se começar a desesperar pela espera, pode sempre telefonar e
perguntar em que pé vão as coisas. Mas há coisas que o Sr. Silva não deve fazer
de forma nenhuma: chatear a editora com repetidas mensagens, perseguir o
assistente ou editor nas redes sociais ou blog e bombardeá-lo com mensagens,
mandar e-mails em que manifesta a sua impaciência e desagrado com a demora de
forma veemente (a não ser que tenha boas razões para isso).
Agora imaginemos que o Sr. Silva foi aprovado
para edição pela editora XX. Ah maravilha! O Sr. Silva vai ser escritor! Vai
ser rico! Desengane-se, Sr. Silva. Rico não vai ser de maneira nenhuma. Não
estamos nos EUA em que o escritor vende um livro a uma editora e pode fazer
ainda algum dinheiro jeitoso com essa venda. Até porque só em raras exceções publicam-se mais do que 2000 a 3000 exemplares (e falo das grandes
editoras). Elabora-se um contrato, recebe um X de pagamento, e depois fica à
espera da percentagem que cabe ao autor pelas vendas, se houver boas vendas.
Quem está nisto pelo dinheiro, vai ficar
desiludido. Bastante desiludido. E a não ser que se chamem Paulo Coelho ou Mia
Couto , não dá para viver só da escrita em full-time, sorry!
Agora,
imaginemos que o editor pedia ao Sr. Silva para reescrever o final do seu
manuscrito porque achou-o demasiado fraco. O Sr. Silva só não tem um enfarte
porque vai ser escritor daí a meses e quer estar bem de saúde para ver o seu
livro publicado. Reescrever o final?! Nem pensar! Mas quem é que esse editor pensa que é? O manuscrito está perfeito, não
precisa de ser reescrito coisíssima
nenhuma. Pois é, Sr. Silva, acontece que o editor sabe o que é melhor para si e
se ele recomenda a reescrita do final, então é porque o final tem que ser
reescrito. E agradeça aos santos não lhe ter pedido para reescrever mais
coisas.
Chegamos
à parte da produção do livro. A única coisa que interessa nesta parte ao autor
é a revisão do seu manuscrito, um processo que pode e deve acompanhar, mas de
forma comedida e sem exigências de prima-donna. A capa será escolhida
pelo editor, e não pelo autor, pelo que se não gostar da capa, pode expor os
seus argumentos junto ao editor, mas este terá sempre a última palavra.
Finalizada a produção do livro, passamos à
distribuição nacional do livro e a respectiva promoção. É importante frisar que
cada editora tem o seu sistema de distribuição, algumas mais fortes do que
outras. Quanto mais abrangente for o circuito de distribuição, significa que
maior poder de manobra e capacidade financeira detém uma editora.
E
eis que chegamos à fase final, a promoção do livro. Nos tempos que correm o autor
tem um papel cada vez mais ativo na divulgação do seu livro junto ao público,
seja através de redes sociais, blogs,
lançamentos (nacionais e regionais), contatos de imprensa, etc. É cada vez mais
esperado que o autor faça esse trabalho em colaboração com a editora que fará o
seu próprio trabalho de divulgação. Mas a verdade é que quanto melhor o perfil
comunicador do autor, mais hipóteses tem de chamar a atenção de forma positiva.
Nunca é muito bom para o autor demonstrar em público que afinal não fez bem o
trabalho de casa.
Há também muito sururu em torno de conchavos e Q.Is
(quem indica) e necessidade de
recomendações para conseguir
publicar um livro. Acreditem em mim. Se as publicações fossem todas à base de conchavos não veríamos tantos livros a serem lançados no
mercado diariamente, para além de que seriam sempre os mesmos. Que elas
existem, existem, mas atenção que conhecer pessoalmente o editor não significa
ser publicado por ele. Significa apenas que tem mais hipóteses em ter o
manuscrito lido e avaliado. Um editor afinal está a gerir uma empresa que não
pode funcionar em função de amigos dos amigos. Da mesma forma, nunca passaria
pela cabeça de um bom editor recusar ver candidaturas espontâneas porque sabe
que pode estar a escapar-lhe algo de valioso.
Como devem adivinhar, esta não é uma ciência exata
e está sujeita a muitos fatores. Nada é garantido, mas se as vossas
expectativas não forem cumpridas, não culpem apenas as editoras. E
principalmente não me culpem a mim se nada do que aconselhei resultar.*
Safaa
Dib
Assistente
Editorial
PUBLICADO
POR SAIDAEMERGENCIA
*O texto foi adaptado por mim
para o leitor brasileiro,pois,foi escrito á maneira portuguesa.
VISITE NOSSAS PÁGINAS.
Oi Miriam! Falou e disse tudo nesse excelente post que adaptou! Hoje em dia todos são escritores,mas poucos conseguem chegar ao mercado,com certeza! bjs e boa semana,
ResponderExcluirAnne,estamos tendo uma indigestão de "literatos";todo mundo escreve sobre tudo e quer publicar.Falta á maioria,estilo,conhecimento,um bom exercício de gramática,aptidão e,sobretudo ,bom senso.Falta ás editoras,quase sempre muito gananciosas,um filtro que lhes permita só publicar o que vale a pena.Centenas vivem ás custas dos ingênuos que vivem a ilusão de ,um dia,ser um grande escritor.É o que eu sempre falei amiga:"O sabido vive do bobo e o bobo do seu próprio trabalho."
ResponderExcluirMil bjs e toda minha admiração.